29.6.11

Memórias de uma Manta







Era uma vez uma manta de flanela colorida com indiozinhos, cavalos e cenas de faroeste.
Era o colo da mãe que nos acalentava para dormir nas noites frias de inverno, e brincava de esconde esconde nos dias quentes de verão. Ela não era uma manta qualquer, ela tinha alma que acolhia a mim e a todos que passaram nesta aldeia.
Uma manta encantada, mágica para todos nós que tivemos a possibilidade de conhecê-la.
Duas, cinco, oito ou mais pessoas, dormindo juntinhos num edredom no chão imaginando historias que estes indiozinhos e cavalos viviam ou poderiam viver. Tudo era alegria e brincadeira, um verdadeiro clã.
Passávamos as noites conversando, cantando, sorrindo, chorando, celebrando a vida e o amor sempre. Ouvíamos Pink Floyd, Vangelis, Enigma e muitos outros.
Quanta vida! Quanta alegria! Quanta história!
De índios, reis, animais, seres invisíveis e nossas.
Todos eram irmãos de alma, de idéias e de coração.
Havia até promessas e juras de amor. Amores começaram e acabaram debaixo desta manta.
Ela ouvia nossos corações, sonhos e dores. Sorria de alegria quando o amor tocava nossa alma e nos acolhia e enxugava nossas lágrimas quando alguém partia e nos deixava sós.
Todos cresceram e partiram para bem longe e ela também se foi junto com outro alguém.
Fiquei só. Com frio, com sede, sem histórias, sem colo, sem alegria, sem nada.
Vazia, oca por dentro.
Procurei nas estradas da vida e do tempo, algo que me fizesse sorrir de novo.
Período longo e difícil.
Na vida, a roda do tempo gira, um dia encontrei-a guardada, intacta, dobrada, desbotada, mofada, sem vida, num fundo de uma fria prateleira de tijolos.
Estava esquecida, só e triste como eu.
Foi uma grande surpresa, coloquei no colo e choramos juntas de felicidade.
Dei-lhe um banho com ramos de alecrim e coloquei-a para secar ao vento e ao sol.
Ficou brilhante e macia de prazer e alegria.
Fizemos então um pacto.
Hoje, caminhamos juntas pelo mundo a fora, ela nos ombros, sentimos que todos partiram, mais estamos juntas pelo amor e pela vida. Minhas memórias me fizeram gente, anjo, mulher ou qualquer outra coisa. Viajamos pelos rios, mares, ruas e esquinas, conhecendo as loucuras dos dias e os perigos da noite, as labaredas das fogueiras e os sussurros do vento. Lá vamos nós...

7 Comments:

Blogger Unknown falou...

A manta era um misto do mágico com o sagrado. Mágico talvez, e muito mais, pelos aspectos "físicos", pois ela comportava, sob si, duas, dez, quantas pessoas viessem. Sagrado pelos valores que se guardavam à sua presença: respeito, amizade, cumplicidade, e tantos outros que tornavam tudo aquilo uma verdadeira confraria.
Quantos segredos, quantas confissões, quantas juras, tantos amores, de amigo, de irmão, de amante, sem que nunca deixasse de existir o sentimento que unia a nós todos: a ingenuidade.
Saudade é a única coisa que pode definir o que restou. Mas não só da manta, muito mais de tudo que éramos.

Lut

2:01 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Debaixo dessa manta, muita coisa aconteceu, descobertas, coisas foram ditas, corações despedaçados, emoções a flor da pele, uma aura de mistério e alucinações emana dela.

9:24 AM  
Anonymous Anônimo falou...

QUASE VINTE ANOS SE PASSARAM E O QUE FICOU? SAUDADE.ESSA MANTA É O EXEMPLO DE SIMBOLISMO DA SEGURANÇA QUE TANTO ALMEJAMOS NA VIDA, SEM QUE TENHAMOS IDÉIA E DIMENSÃO DESSA BUSCA, PARA SEMPRE MANTERMOS NOSSA ESTIMA ELEVADA ATRAVÉS DO TOQUE, DO AMOR A SI PRÓPRIO E AO OUTRO. OBRIGADA, GEU, POR TER TIDO ESSA VISÃO DE MUNDO TÃO IMPORTANTE, DESDE AQUELA ÉPOCA...
VOCÊ NÃO ESTÁ SÓ; ESSA É APENAS A MANIFESTAÇÃO DA NOSSA ESSÊNCIA. ESTOU AQUI. GRANDE BEIJO E PARABÉNS, ZUBI.

11:26 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Esssa manata, para mim, era o abraço amigo, caloroso... um coração onde sempre cabia mais um... agente se encolhia e aconchegava e as vezes passava o dia inteirinho assim, aninhados uns aous outros como se vital fosse cada uma das presenças. Ora a manta servia de testemunhas de histórias tão cenicamente diferentes das suas, mas alí permanecia como platéia atenta e cativa. Era de flanela, amaciada pelo tempo e por cada corpo e espírito que dela se servia. A manta era uma espécie de Forest Gump, uma contadora de histórias, de todas as possíveis e imaginárias. Engraçado. agora, repensar essas imagens e memórias! E, mesmo distante, sentir que seu poder acolhedor permanece, agora na alma! Que delicia!
**Kath**

8:12 PM  
Anonymous Anônimo falou...

Tatiana disse...
A manta era o limite do sagrado. Na casa da velha bruxa-criança o quarto era o reduto dos especiais, dos queridos, dos amados e a manta era como um solo sagrado, que não se pisava sem respeito ou reverência.
A manta era como um ventre de mãe, cheio de calor e aconchego.
A manta era uma prova de afeto concreto, um presente dividido.
A manta era a prova que doar nunca é demais.
Era o coração de Angélica, onde recebia tantos e tantos.
A manta era uma outra forma de dizer: eu te amo.

1:54 PM  
Blogger Maria Angélica falou...

Barabara disse...
A manta... Ela era enorme, para nossos corpos pequenos. Todos embolados, juntos... O prazer de estar simplesmente juntos. O aconchego, as brincadeiras, a alegria, a quenturinha boa. Hoje, lembro dela com saudade.

1:56 PM  
Anonymous Anônimo falou...

oi Géo. Coisa linda! Adoro sua pesquisa com a manta. Vc fez retrato de todo mundo, quero um meu também. Saudade.

1:52 PM  

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